TRILHAR OUTRO CAMINHO

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A crise, hoje, amplamente discutida por todos os setores sociais, não é tão nova como se pensa, tampouco exclusiva dos tempos atuais. A humanidade vive em permanente crise. Ela se manifesta, sempre, de modos diferentes. A crise de hoje, do ponto de vista econômico e social, nada mais é do que uma nova crise do capitalismo, sistema no qual estamos imersos há vários séculos. Essas crises, relacionadas a transformações nas relações de poder econômico e político, estão, por sua vez, associadas a mudanças tecnológicas, especialmente nos processos produtivos.

Vivemos, hoje, a quarta revolução industrial. Na primeira, entre 1760 e 1830, houve mudança da produção manual à mecanizada. A segunda revolução, gerada sobretudo pela introdução da eletricidade nos processos produtivos, favoreceu a produção em massa. A terceira ocorreu desde os meados do século 20, com o desenvolvimento da eletrônica e as telecomunicações. A quarta revolução, de cunho digital, está provocando automatização acelerada dos processos produtivos, independizando-os de atividades humanas.

Centenas de economistas e líderes governamentais de nações ricas, reunidos no Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça, nos últimos dias, se manifestaram entusiastas com esse tipo de revolução, pois reforça seus ideais de uma economia modernizada, a seu favor. Com ela, a economia mundial crescerá enormemente para os que têm capacidade de inovação e adaptação. No entanto, as economias de países tidos como subdesenvolvidos e emergentes, incapazes de se modernizarem no mesmo ritmo, estão sendo atropeladas.

Essa disparidade no desenvolvimento das nações, tem sido claramente questionada pela Doutrina Social da Igreja, com pronunciamentos significativos de nossos Papas. Paulo VI, em sua Encíclica sobre o Desenvolvimento dos Povos, de 1967, já se referia a essa “dura realidade da economia moderna”, como um mecanismo que “arrasta o mundo, mais para a agravação do que para a atenuação da disparidade dos níveis de vida: os povos ricos gozam de um crescimento rápido, enquanto os pobres se desenvolvem lentamente”.

O Papa João Paulo II, em sua Encíclica Centésimo Ano, de 1991, afirmou que as nações mais pobres “têm necessidade que lhe sejam oferecidas condições realisticamente acessíveis”, por meio “de uma concertação mundial para o desenvolvimento, que implica inclusive o sacrifício das situações de lucro e de poder, usufruídas pelas economias mais desenvolvidas”. Em sua mensagem para o Dia Mundial da Paz, em 1° de janeiro de 2004, evocou a necessidade de uma nova ordem mundial fundada na solidariedade entre países ricos e pobres.

O Papa Francisco, por sua vez, afirmou na Exortação Apostólica Alegria do Evangelho, de 2013, que “a economia deveria ser a arte de alcançar uma adequada administração da casa comum, que é o mundo inteiro”, e destacou que “se realmente queremos alcançar uma economia global saudável, precisamos, neste momento da história, de um modo mais eficiente de interação que, sem prejuízo da soberania das nações, assegure o bem-estar econômico a todos os países e não apenas a alguns”. Ele é contundente em sua proposta de mudanças estruturais na economia global.

A tão comentada crise brasileira está, portanto, relacionada à ordem econômica mundial. Estamos saturados de problemas causados por enormes contradições globais. Essa crise, no entanto, é uma oportunidade para libertamo-nos de dependências históricas, por meio da cooperação entre nações que andam a pé na estrada da livre concorrência econômica, atropeladas por outras com seus veículos potentes. Se o governo atual persiste em continuar nessa pista de corrida desleal, que para nós é mortal, cabe-nos, como cidadãos e cidadãs, insistir que necessitamos trilhar outro caminho.

Jales, 31 de janeiro de 2017.

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